sábado, 30 de agosto de 2025

Entre as peças que não se encaixam

Encaro a folha em branco depois de um longo tempo distante. Perdi a intimidade. Com a escrita e comigo mesmo.

Não quero que seja mais um texto como aqueles tantos que escrevi no auge dos meus 14 anos. Mas não posso negar que se parecem com eles. Todos não passam de uma grande ânsia de despejar tudo em cima de uma mesa e montar esse quebra-cabeça.

As peças não encaixam, nenhum desenho se forma. E depois de horas encarando aquele amontoado, percebo que estou justamente nos abismos entre uma ponta e outra. Eu sou o não encaixe, os buracos sem peça, o vazio.

Eu tento acreditar que existe um motivo, e procuro fortemente por ele aqui dentro de mim. E eu até posso encontrar diversos nesse meio do caminho da procura, mas nenhum que realmente me pareça real. Talvez eu seja o problema.

Paralisada pela milésima vez. Mais uma tarefa acumulada na pilha de papéis ao lado. Mais uma frustração para a lista de fracassos.

E na ânsia de me entender, vomitei palavras soltas, que nada dizem e nada resolvem. O aperto permanece, o sentimento também. Uma das mil vozes aqui dentro grita coisas absurdas, que se rebatem em um eco infinito. Um eco que, não importa o que eu faça, eu sei que voltará a soar vez ou outra. 

Meu jeito de lidar? Afogando-o. O problema disso é que às vezes eu me afogo também.


sábado, 24 de maio de 2025

Janelas

Esta manhã procurei por uma frase em um livro. Procurei, procurei, procurei mais um pouco, e nada. Agora estou aqui, questionando minha sanidade, sem saber se ela existe de fato ou se fui apenas mais uma que atribuiu a Clarice Lispector uma frase clichê que ela nunca disse.

Então decido: se ela não existe, eu a invento agora.

“Quando pequena, desenhei um retângulo na minha parede. Ontem, preenchi esse espaço de azul.
Hoje, acordei com o barulho das ondas. Sem perceber, fiz uma janela para o mar.”

domingo, 5 de maio de 2024

Às vezes me pergunto quantos “lás” existem por aí... Amores não vividos, amigos não feitos, conhecimentos jamais aprendidos.

Em um dia não tão qualquer, após uma sequência de coincidências nada coincidentais, minha versão do passado deu o primeiro passo daquela encruzilhada. Agora aqui estou eu, olhando pela janela de um dos tantos “lás”.

E bom, tudo realmente estava lá. Ou melhor, aqui.


Última vez

A vida é uma sequência infinita de últimas vezes.

A última vez que fiz um café naquela xícara que quebrou ou que deitei naquela parte que bate sol às 15h da tarde de um domingo primaveril na minha sala. A última vez que abri aquele caderno esquecido, que comi aquele doce que pararam de vender, que usei aquela caneta que perdi. A última vez que ouvi aquela música, que dei um abraço naquela pessoa querida, que beijei o meu primeiro amor. A última vez que ouvi meu nome saindo dos seus lábios, a última vez que...

Sentada ao lado daquele forno, sentindo o calor do fogo em minhas mãos, eu não tinha noção do tamanho da preciosidade daquela cena. Me apego a lembranças por ser tudo o que me resta, mas e se um dia for a última vez que eu me lembrar delas?

Me apeguei a memórias de uma vida, sem imaginar que um dia seria a última vez que eu me lembraria delas. Se somos nossas lembranças e nossas vivências, o que nos tornamos quando elas nos abandonam?

Vai haver um dia em que talvez meu nome não soe familiar. Ainda serei eu?

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Uma lua de distância

Eu me lembro daquela noite em que a lua sorriu para mim. E hoje, ela aqui tão cheia, me lembra das minhas promessas passadas, de quando eu acreditava de forma ingênua no amor e no futuro.

Uma lua separava a gente, e hoje o que me separa do mundo é esse enorme peso de não sentir tanto assim. Ou sentir demais. Os dois ao mesmo tempo, sempre.

Hoje a lua me lembrou daquela noite em que eu acreditava fortemente em nós. Nos reflexos da água, um amor que nunca senti. E hoje me culpo por não estar lá, onde a lua estava na primeira vez que amei.

Lembro como se fosse ontem da noite em que a lua sorriu pra mim, cercada de estrelas como eu jamais havia visto.

A bebida desce amarga, com gosto de culpa, com gosto de desgosto, com gosto de “errei mais uma vez”. 

Todo mundo diz que qualquer coisa está ali, mas afinal, o que é qualquer coisa? Me sentir um peso só piora tudo. Eles dizem para eu pedir socorro, mas como gritar quando lhe falta voz? Eu já não sei mais fazer isso como antes, não me sinto mais íntima e amiga do pedaço de papel em branco, na verdade, sigo tendo medo, mas dessa vez avanço com desprezo por tudo aquilo que já passou.

Todo esse texto só faz sentido na minha cabeça. É um desabafo que absolutamente ninguém seria capaz de desvendar.

Eu quero colo. Eu quero solidão. Eu quero o extraordinário. Eu quero o pouco que me convém. Eu quero pedir socorro. Eu quero não fazer alarde. Eu quero que me entendam. Eu não quero me expor tanto assim.

A lua segue me encarando, como se estivesse conversando com versões antigas minhas, mas elas não existem mais e resta-me respondê-la com esse aglomerado de palavras que talvez só ela seja capaz de entender.

Afinal, aquele dia no carro, entre um sorriso e tantas estrelas, ela me disse que a vida valia a pena. E hoje, o mesmo rosto que sorriu junto atrás do vidro estático, mal consegue se manter em pé. O mesmo corpo que sentiu cada gota de esperança percorrendo o seu corpo, só consegue pensar em um possível fim.

Não queria tanto drama. No fundo, acredito que estou a uma lua de distância de mim.

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Entre paredes vazias

O cômodo não é novo, já estou aqui a algum tempo. Mas sempre esteve vazio assim? Eu verdadeiramente não sei dizer. Olhando agora, vejo o paradoxo de sentir que aqui já esteve cheio de móveis, luz e momentos, ao mesmo tempo que parece que sempre esteve assim e só agora parei para notar.

Lembrei que um dia o chão já rangeu. Não ouvi nada hoje. É difícil lembrar que algo existiu quando não acontece a tempos.

Era pra eu me sentir em casa em algum lugar? 

Sempre no meio termo, no meio do caminho, no meio do conflito. Uma vida morna por medo de lidar com os extremos.

A apatia dói mais do que a tristeza.

Por um momento desejei ter uma mãos nas minhas, mas me dei conta de que seria apenas um jeito fácil de depositar toda essa minha falta em alguém. Ao mesmo tempo que quero ouvir o som da campainha, não quero receber visitas.

Eu não tenho motivos para estar assim, mas dói. O nada dói, e muito.

Entre um verso e outro

Te vi. Você me viu. No escuro, nossos corações se sentiram.

Te puxei para dançar, e você entrou nessa comigo. Olhares intensos, sentimentos a mil. Com você o ritmo era leve, me senti viva como nunca. O salão ficou mais colorido, as luzes mais vivas, meu sorriso mais sincero e genuinamente feliz.

Mas você se foi antes da primeira música terminar, e me vi obrigada a reaprender a dançar sozinha enquanto a música ainda tocava ao fundo.

Os primeiros passos são sempre os mais dolorosos, eu sei. Aos poucos retomo o ritmo e relembro de como era um passado sem você. 

Eu não te culpo, e no fundo sei que era melhor assim. Mas ainda dói. 

O baile definitivamente não é o mesmo sem você, mas estou sobrevivendo. 

Saiba que te guardarei com carinho entre um verso e outro da canção. Guardei em mim o sentimento, e o toque das nossas mãos. 


Amanheceres

Enquanto eu olhava nos seus olhos, o sol se pôs milhares de vezes sem que eu pudesse notar. Eu amo o pôr do sol, já te disse isso? Mas sempre tenho medo do depois.

Irônico eu amar ver a luz ir embora, e ter tanto medo da escuridão. No fundo, acho que eu gosto do "quase". Aquele tom de verde quando os raios amarelos batem. Aquele sol que toca minha pele, mas não queima. Entre tantos anoiteceres, você foi meu "quase" preferido.

Na última noite, quando fui engolida pela escuridão, percebi que perdi minha luz por aí. Não sei exatamente onde, e nem quando. Talvez entre um pôr do sol e outro, talvez entre um "quase" e outro.

Essa tal jornada deveria ser sobre mim? Acabo de perceber que nunca assisti um pôr do sol sozinha, bom, ao menos não intencionalmente. 

Esse texto não é sobre você. Nunca foi. É sobre mim. Um lembrete para que eu comece a ver também os amanheceres.

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